Artigos @MarKramer

1. Oposição: conivente por omissão – dezembro 2010


Como brasileira, pura e simples, percebo, como muitos outros, que estamos vivendo em um país absorvido pelo caos. Um país onde o ufanismo do “estamos todos bem” convive com péssimos índices na educação, saúde, segurança pública, nos altíssimos valores da dívida interna, na mentira de que não existe uma dívida externa, na ausência de investimentos na infraestrutura, em um surgimento continuo de escândalos sobre corrupção nos organismos púbicos, cujo desfecho é a impunidade, no desejo do governo de turno de alcançar o monopólio institucional sem criticas. Estamos vivendo uma era onde o presidente da república torna-se cabo nas eleições e rasga a lei eleitoral, tem expediente de trabalho, não cumpre o que diz, e, diz uma coisa hoje e outra amanhã sem sofrer qualquer tipo de incomodo ético. A recém eleita presidente semana passada prometeu realizar um governo austero considerando a fabulosa dívida interna do país. Dias depois difunde a noticia da possível compra de um novo avião presidencial (no máximo 10 países no mundo o presidente tem avião próprio, a cumprir-se a nova compra, os ricos brasileiros teriam 2), assim como a possível contratação de dezenas de novos funcionários não concursados para o Palácio do Planalto, e a ampliação do número de ministérios que já são 37. O endividamento familiar e a explosão imobiliária já se tornam preocupantes, mas não parece inquietar o governo, sobretudo o presidente, que se mantém no palanque desde o primeiro dia e dali ainda não saiu com sua pregação diária, que não raro esta sob bases falsas. Jornais e jornalistas alinham-se, por interesses ou ideologia, mais pelo primeiro e menos pelo segundo, ao governo o apoiando em realizações ditas inéditas e redentoras do país, embora estas realizações não sejam nem originais, e muitas vezes não constituem de fato uma realização, sendo nada mais do que uma possibilidade de futuro. Por parte da imprensa observa-se a quase total ausência de critica, como se de fato “estivéssemos todos bem”, e todos os dados que negam esta “realidade” são desconsiderados no discurso posterior. Sem me prolongar, se estivéssemos “todos bem” não seria necessária a Operação Rio, pois questões sociais, urbanas, policiais e jurídicas em uma das maiores e mais ricas cidade do país estariam bem resolvidas. Ao contrario, vimos a intervenção militar em bairros do Rio como mostra cabal do fracasso das políticas sociais, infraestrutura urbana, e de segurança pública nesta cidade. Exemplo simbólico do que ocorre na grande maioria das cidades médias e grandes do país como todos sabemos. Enfim, estamos vivendo um total caos nas instituições públicas, liderado pela ineficiência, ausência de ética, e desejo de autoritarismo do governo central que infesta de incompetência e imoralidade por onde passa, pela irresponsabilidade do poder judiciário na exigência do cumprimento da lei, pela cooptação interessada de muitos meios de comunicação, e pela negligência da maior parte da oposição.

Deste momento em diante passo a refletir sobre o último item, entendendo que a oposição, a partir de seu silencio frente à má gestão do executivo e a ausência de comprometimento com a parcela da sociedade que representa se torna cúmplice deste despautério. Quando a oposição não cumpre sua tarefa de colocar limites na atuação governamental ela se torna conivente por omissão, e como efeito paralelo favorece o abuso de poder e a confiança na impunidade por parte da situação, assim como deixa sem voz o eleitorado opositor. Fazer oposição é um direito e um dever político na democracia, não uma opção partidária.
No sistema democrático é responsabilidade da oposição fiscalizar o governo institucionalizado em sua atuação frente à legislação vigente, a priorização das demandas e a vigilância dos interesses da sociedade, assim como defender as reivindicações do contingente opositor. Para tanto, a oposição deve ser constante, atenta, critica, e profissional. Deve denunciar abusos e incompetências, protestar publicamente, e agir com firmeza para impedir atos ilegítimos ou que lesem os interesses do povo.
O papel da oposição é igualmente relevante ao da situação, pois ambas representam parcelas da sociedade. A oposição é parte da democracia, sem a qual a democracia é imperfeita, perde qualidade. A democracia é o sistema político do, para e pelo povo, e, portanto toda sociedade deve estar representada ativamente no campo político, não apenas a maioria que vence as eleições. Quando a oposição falha, ela retira de seus eleitores o direito de terem voz no debate político. Portanto é fundamental no sistema democrático o equilíbrio de poder entre situação e oposição. A situação gestiona e realiza, e a oposição fiscaliza e limita através de sua presença e ações o poder institucionalizado. A ausência de equilíbrio entre ambas as forças, desestabiliza o sistema criando grandes ou pequenas anomalias prejudiciais ao seu funcionamento que terão conseqüências diretas ou indiretas na sociedade civil. O equilíbrio entre os discursos situacionistas e oposicionistas frente à opinião pública deve estar evidenciado e simbolizado na exposição na mídia. Ambos os lados devem receber atenção similar dos meios de comunicação na busca de promover equidade no debate, como base de informação e politização da sociedade civil, também fundamentos da democracia.
Nesta ótica, a oposição deixa de ser vitima de monopólio mediático, e do ufanismo criado pelo governo petista, para tornar-se um dos elementos que contribuem para a sua existência. A oposição que denuncia no período eleitoral é a mesma que calou antes, e não agiu para a alteração de rumos das políticas que ora critica. A oposição que apontou os erros da administração de turno na campanha eleitoral, é a mesma que se cala frente a possibilidade de restituição da CPMF, a possível aquisição pelo Estado do Aero Dilma, ao fracasso das políticas públicas na área da segurança que resultaram na Operação Rio, a ampliação de CCs pelo governo federal, ao salário mínimo de R$ 540,00, às criticas e desvalorização do TCU como órgão fiscalizador por parte do governo, a absolvição de Palocci, a qual cria antecedentes para uma situação similar em relação ao José Dirceu, etc.
Neste sentido, verificam-se dois aspectos: primeiro, a dimensão alcançada pela atitude passiva de nossa oposição, que a coloca como conivente com o setor ao qual deve opor-se, ou seja, agrega força e poder ao seu opositor. Situação totalmente contraditória sob o ponto de vista conceitual, com importante repercussão na realidade; em segundo lugar, este fenômeno não parece ser produzido pela cooptação da oposição pela situação, mas pela incapacidade e  inabilidade política, assim como pela ausência de uma estrutura adequada  de nossa oposição para enfrentar o poder constituído, o que segundo Reinaldo Azevedo, deve-se a uma leitura equivocada da realidade. 
Neste contexto, existe uma convicção inegociável, nosso interesse de manutenção da democracia, e com ela a oposição como um de seus fundamentos. Portanto, entendo que nossa tarefa como eleitorado opositor visa entender o comportamento da oposição e pressioná-la constante e firmemente para que ocupe o espaço que lhe pertence por dever e direito. Assim, não resta outra que elaborar e divulgar uma segunda parte deste texto. Aguarde!



2. Oposição: entre a gestão e a ideologia – janeiro 2011

Torna-se cada dia mais evidente, após os oito anos nos quais a situação ocupou todos os espaços do campo político no Brasil, que o PSDB contém um impedimento congênito de atuar como partido de oposição. Trata-se de uma questão instigante, considerando que no mundo político de uma democracia é capital que os partidos estejam preparados para viver suas duas possíveis realidades – situação e oposição – as quais são necessariamente transitórias e antagônicas. Entretanto, observa-se que o PSDB mostra-se incapaz de atuar como partido de oposição, e embora muito se tenha especulado sobre as razões desta atitude, elas se mantém nebulosas. Estas questões seguem presentes, mas por ora, proponho apenas uma aproximação da questão central, reflexionando sobre a importância do discurso ideológico, ou de sua ausência, na última eleição presidencial.

Após o final das eleições, e mesmo durante, muitos artigos difundidos pela imprensa criticavam a ausência na disputa do debate político, ou seja, a discussão sobre o suporte teórico, as ideologias dos partidos em disputa. Neste momento, é justo fazer-se uma ressalva a Plínio Arruda do PSOL, quem mesmo apresentando uma plataforma radical, não hesitou em esclarecê-la e defendê-la. Concentremo-nos, porém naqueles com reais condições de vencer o pleito, os candidatos do PSDB e do PT.
As bases de construção da candidatura de Dilma Rousseff apóiam-se na completa absorção de sua figura pelo “mito” Lula. Ambos constituiriam uma “unidade” não homogênea, na qual Lula, o todo-poderoso, dividiria sua carga de significados com Dilma, pouco conhecida, sobretudo da maioria, e, portanto, isenta de uma imagem própria. Neste sentido, Rousseff é respaldada na campanha, não apenas pela popularidade de Lula, mas pelo suporte ideológico do PT e do     “lulismo”. Ambas as posturas são simultaneamente convergentes e contraditórias, pois o lulismo é a forma de governar adotada por Lula produto da impossibilidade de executar na integra o ideário do PT. No exercício de seus mandatos, e até para chegar a eles, Lula foi obrigado a fazer concessões, muitas opostas ao plano original do partido, gerando um modelo misto singular, entre a esquerda radical e a social-democracia, que leva seu nome. Na prática Lula tentou aliar seu pragmatismo, a manutenção da política macroeconômica do governo anterior, a ausência de pudor ao cooptar com representantes da direita tradicional e do mundo empresarial, com a política petista, cujas propostas são o banimento de todo o estabelecido. Desta permaneceu pouco mais que o apoio às antigas lutas como MST, o sindicalismo, o aparelhamento do Estado, e a sombra do PNDH-3. Tal modelo misto resultou em um governo de incoerências, soluções improvisadas, imediatistas, da ausência de critérios morais, narrado pelas falácias de um discurso espetaculoso. Entretanto, a habilidade política de Lula colocou a realidade em segundo plano, e alavancou ao protagonismo a idéia da justiça social, da luta de classes entre ricos e pobres, nordestinos e sulistas, colocando-se como o redentor dos desamparados. Trata-se de uma plataforma histórica da esquerda/PT, agora executada no estilo “lulista”.  Não menosprezando as conseqüências da expansão econômica do país, claro fruto da continuidade da política macroeconômica e das estruturas institucionais estabelecidas por FHC, sobre as quais Lula tem poucos méritos, é o discurso ideológico que legitima seu governo assim como sua continuidade. A idéia de um Brasil mais justo, com menor desigualdade, com oportunidades para todos presente nos corações e mentes de uma multidão de brasileiros, sobretudo os que sofrem o drama social, esta impregnada da figura de Lula. O presidente efetivamente pouco fez para possibilitar melhor qualidade de vida a todos, mas soube trabalhar e valorizar estas idéias.

Em oposição a Lula e sua candidata esta José Serra, um político virtuoso, excelente administrador público, que traz no currículo diversas obras no campo da saúde, educação, meio-ambiente, infraestrutura urbana, etc. Homem de reputação ilibada, com quase trinta anos de vida pública, cujos próprios adversários reconhecem ser mais bem preparado. Sua campanha foi baseada exatamente nesta história de obras, honestidade, e promessas cumpridas. Sua capacidade de gestão, “aquele que sabe como se faz” era o grande trunfo dos partidos de oposição aliados sob o lema “O Brasil pode mais”. Embora esta engenharia pareça coerente observa-se agora, devido o distanciamento temporal, que a estratégia adotada rejeitava deste sua gênese o confronto político, contendo desde aí as sementes de seu fracasso. O discurso explicito e implícito inerente à fórmula de apresentar um candidato idôneo, com capacidade reconhecida frente à inexperiente e quase desconhecida Dilma, é tornar o primeiro o herdeiro legitimo das atribuições de dar seguimento a expansão econômica que vive o país. A mensagem de continuidade esta expressa já no slogan, e é reforçada pela negação do governo de FHC, pela postura de Serra frente a Lula, e na presença desse, mesmo que fugaz, na propaganda da oposição. O slogan difundido não propõe mudança ou critica, ao contrario, reconhece como positivo o que foi feito, e o valida como estágio a partir do qual se deve avançar. Ao analisar a prioridade atribuída à imagem de continuidade no discurso da oposição verifica-se que a estratégia responde a proposições claras: 1. explorar a indiscutível capacidade de gestão pública de Serra; 2. abster-se da confrontação com um governo cujo presidente detém alta aprovação popular; 3. desviar-se da dificuldade crônica do PSDB de exercer como partido de oposição. Neste sentido, a campanha presidencial de 2010 foi o corolário de oito anos nos quais PSDB mostrou-se incompetente como partido de oposição, criando um vazio político na democracia brasileira.

A partir da decisão de não fazer oposição tomada por Serra e seus assessores a campanha assume um papel paradoxal, que renega a lógica da ciência política de um regime democrático, onde a oposição se apresenta como continuidade da situação. Ambos, Serra e Dilma, se propõem a dar seguimento ao governo Lula, sendo que a oposição afirma ter o melhor candidato. O tema central do debate nestas circunstâncias passa a ser a capacidade de gestão dos candidatos, conseqüentemente, a discussão política, ou confronto ideológico, perde espaço.

A inexistência do debate político na campanha favorece ao PT. Embora sua candidata não seja carismática, eloqüente, ou contenha uma carga simbólica importante, tem atrás de si um discurso ideológico histórico e amplamente difundido, apesar de não passar de discurso. No que tange a Serra, a situação é inversa. O PSDB é um partido social-democrata, e portanto contém bases intelectuais definidas, mas quantos de nós sabem o que é, quais são os princípios, como funciona uma social-democracia.  Segundo o Instituto Teotônio Vilela, a “social-democracia propõe uma sociedade em que os ideais da igualdade e da justiça social convivam com a preservação das liberdades democráticas e individuais, no contexto de uma economia de mercado”. É contrária a economia estatizada assim como rejeita a soberania do mercado.

As campanhas são fundamentais na consolidação e difusão das bases ideológicas dos partidos, pois são elas que definirão as políticas sociais, econômicas e culturais. A ideologia é a visão de mundo que rege as ações e relações no mundo político, assim como as propostas de construção do futuro. É com a ideologia que nos identificamos, é por ela que nos apaixonamos, não pela aridez dos números. Serra perdeu uma grande oportunidade de consolidar e difundir uma ideologia opositora, optou por priorizar a gestão, entretanto, na política, gestão sem ideologia não funciona.


3. Apenas o alcoolismo não explica – janeiro 2011

Ucho Haddad conclui seu artigo “Irresponsável, Lula transformou a Presidência da República em botequim de esquina” , aconselhando “se beber não governe!”, indicação que tem como referencia Lula, e suas atrozes palavras e atitudes durante os dois mandatos, culminando em feitos desastrosos neste final de governo, os quais superam os adjetivos disponíveis no rico vocabulário português para definir o descontrole, a vaidade, a ausência de compostura presidencial, etc......
 
Muito deste descontrole é debitado na conta do alcoolismo presidencial. Em si, esta explicação, embora real, é contraditória. O cargo da presidência de um país deve ser assumido por uma pessoa que tenha e mantenha o controle sobre suas ações em tempo integral, como requisito fundamental de governabilidade. A não ser assim, o país esta a mercê, mesmo que temporariamente, dos impulsos, da irracionalidade, da irresponsabilidade, dos delírios de seu governante, daquele que se exige exatamente o contrario. Portanto, como escreve Ucho, “se beber, não governe”, poderia dizer-se, se beber não se candidate a presidência.

Este é o primeiro ponto que desejo enfatizar. Se Lula, ou qualquer outro homem ou mulher, sendo consciente de seu alcoolismo não pode pretender um cargo de governo. No caso, Lula, conhecedor de sua realidade, nunca deveria ter se candidatado à presidência do Brasil. Dirão, mas nenhum ou poucos alcoolistas assumem sua dependência da bebida. É verdade, mas no caso é uma grande irresponsabilidade. Se o candidato prossegue nesta insensatez, o partido que o apresenta como candidato e o povo que o elegeu são coniventes com um descalabro presente já na sua eleição. Portanto, que Lula seria um presidente descontrolado, referindo-se apenas ao alcoolismo, estava claro desde sua candidatura. Não retiro aqui, a responsabilidade de Lula sobre seus atos, mas mostro que se trata de uma inconseqüência também do PT e do eleitorado petista. Não se pode eleger como presidente de um país um alcoólatra!!!! Com certeza Lula não é o primeiro, nem será o último presidente dependente químico da história, mas é isto que você quer para o Brasil?

O alcoolismo de Lula torna-se de conhecimento público no episódio que envolve o jornalista do “The New York Times” no Brasil, Larry Rother, quem escreve sobre a fraqueza de Lula frente às bebidas alcoólicas, motivo pelo qual quase é expulso do país pelo presidente, que através desta reação confirma a afirmação do norte-americano. Pois bem, dando o alcoolismo de Lula como um fato provado e comprovado, pergunto: Deve-se debitar os despropósitos de seu discurso e de suas ações sobretudo ao álcool excessivo? Este é o segundo aspecto que desejo destacar, estabelecer uma relação primordial entre causa e efeito produz uma justificativa automática e superficial. Lula perde a noção da realidade porque “bebe”, ponto. Ou caímos na primeira situação: um presidente não pode “beber”, nem nos momentos de lazer, pois presidente é presidente 24 por dia, 365 dias por ano, durante 4 anos, constituindo-se um paradoxo em si, governante alcoólatra, mas que deve estar assumido considerando que ele já é o presidente.

Entretanto, penso que o excesso de bebida alcoólica ingerido por Lula é apenas parte das causas de suas palavras e atos abusivos.  Atrás desta dependência esta a fraqueza de caráter de um homem soberbo, pretensão de superioridade e conseqüente ausência de humildade e, portanto de verdadeiro valor, inescrupuloso e autoritário. Tais características são alimentadas por uma ideologia que em tese é utópica, e na pratica cria o personalismo e atribui poderes messiânicos (Stalin, Mao, Fidel, Chávez, etc). Que ao sugerir a destruição do existente promove o desrespeito às leis e às instituições, aos valores morais estabelecidos no Estado e na nação, tudo rejeitado devido sua origem burguesa, tomada pejorativamente. Hoje sabemos quais são os princípios “éticos’ seguidos por Lula, são aqueles que favorecem aos seus interesses e aos de seu partido. A conduta exacerbada de Lula, que desrespeita as instituições democráticas e o povo brasileiro, e ultimamente as nações com as quais sempre mantivemos uma relação de amistosa deferência, é resultado de um homem de caráter fraco incapaz de lidar de forma madura e moderada com o poder........e com a bebida alcoólica.

P.S. Escrevo este artigo em nome da indignação decorrente das palavras e atitudes de Lula no final de seu governo.

4. Os políticos estão não são autoridade – fevereiro 2011

Outro dia solicitei aos presentes no Twitter que expusessem sua opinião sobre os motivos do distanciamento existente entre a classe política e a sociedade brasileira. Embora expressas de forma distinta a maioria das apreciações postadas apontavam em uma única direção: a pretensão de superioridade que assumem as pessoas após serem eleitas para cargos políticos, a qual se mantém durante sua estadia no “poder”.
 
O distanciamento entre os políticos e o povo em nosso país é um tema historicamente discutido. Ocorre forte na Primeira República com os protestos das populações urbanas contra a política de privilégios dedicada a monocultura do café e seus beneficiados exercida pelos governantes. É importante saber que os governantes só chegavam a governantes porque apoiados pelos cafeicultores. Talvez aí esteja a origem do problema, ou melhor, talvez aí esteja a primeira oportunidade de expressão de nossas características sociológicas, porque o inicio da República é o princípio de nossa autonomia como povo. 

Não é a intenção aqui fazer uma análise histórica, assim que pretendo atalhar resgatando as palavras de Roberto Da Matta em sua recente entrevista no programa Roda Viva. Nesta ocasião o antropólogo afirmou que a sociedade brasileira é aristocrática e hierárquica. Tais características não constituem uma exclusividade local, ao contrario, participam da maior parte das nações ocidentais, considerando suas especificidades. Assim como, a conquista de maior igualdade social constitui uma experiência relacionada com a flexibilidade cultural e processos históricos das distintas sociedades. O movimento intelectual ocorrido no século XVIII denominado Ilustração e decorrente Revolução Francesa constituem-se na Europa a alavanca para romper com os privilégios da aristocracia da terra e de sangue do Antigo Regime, e a introdução da democracia, promovendo importantes mudanças no campo social. No Brasil é o governo da Revolução de 30 que vai marcar o inicio de uma nova ordem social através da quebra da hegemonia política dos latifundiários, aristocracia da terra, e da legitimação de uma camada média, urbana e profissional. Este processo foi revigorado com a capacidade de estabilização da economia do Plano Real. Se na Europa, mais ou menos de forma geral, se definiu uma cidadania e a instalação do chamado Estado de Bem Estar, no Brasil observa-se que os ganhos têm sido basicamente no campo econômico. Nas dimensões política e social seguimos atados aos velhos padrões o que impede o avanço na direção da construção de uma sociedade igualitária em que todos têm direito a melhoria de qualidade de vida.

Neste sentido, o modelo sociológico definido por Gilberto Freire de “casa grande e senzala”  parece-me refletir nossa realidade política, em conciliação com várias respostas dos twitteiros sintetizadas nas palavras de @mary_rachid, quando escreve “patrões e empregados não se misturam”. Uma analise breve da expressão “casa-grande e senzala” indica a existência de apenas duas esferas, uma que expressa o poder e a força, e o outra que representa sua antítese. Não existe um terceiro status, uma situação intermediária, de equilíbrio. O mundo social esta determinado apenas por duas camadas configurando forte hierarquia, trata-se de uma relação dual entre o “senhor” e seu subordinado, um manda o outro obedece. No primeiro recaem todos os privilégios, direitos e benesses; ao segundo resta aceitar sua própria sorte, trabalhar continuamente, esforçando-se para receber ocasionalmente a generosidade do senhor. A relação entre autoridade e sociedade, mesmo que indignada, presente em nossa realidade política não se afasta muito deste patamar. A aceitação da superioridade de uma aristocracia política esta presente em nossa visão de mundo, conforme as seguintes postagens recebidas, entre outras: “Começa pelo tratamento que se dispensa ao político. O camarada assim que recebe um cargo passa a ser tratado como "semideus" de @Souquemsou2, ou, “Porque eles se esquecem de que apenas nos representam. Nem mais nem menos. E nós também ficamos calados” de @flaviadealmeida, ou ainda, “o político brasileiro age como celebridade, e fica muita gente boba seguido esses caras” de @poetacicero.

Neste sentido, a distância entre políticos e povo existente no Brasil é produto da incorporação como verdade de que a classe política pertence a uma camada hierarquicamente superior. Esta superioridade marca a distância que os “eleitos” devem assumir do homem/mulher comum. Tal percepção não esta apenas na ‘cabeça’ dos políticos, mas difundida em toda a sociedade e define nosso entendimento da relação entre políticos e povo. A partir desta visão compartilhada estabelece-se um imaginário social que forja políticos e povo. Ideologia incorporada e reproduzida historicamente pressupõe a necessidade da figura do superior (senhor-de-engenho, latifundiário, coronel, político), que simultaneamente explora e protege. Tendo como parâmetro a relação original senhor-de-engenho e escravo, gera-se uma dualidade entre a pretensão de superioridade e submissão, onde ambos os lados se reforçam mutuamente. Posteriormente, o político como partícipe desta aristocracia, elite econômica e/ou política, assume as prerrogativas, privilégios e distinções cabíveis do status, assim como reconhecerá como interlocutores apenas os seus iguais. Os demais, ou seja, o povo que o elegeu e ao qual representa pertence ao escalão inferior, e, portanto será desconsiderado.  Esta situação expressa-se na postagem salpicada de ironia de @AparecidoSilva “...porque o povo é muito chato, não se pode dar a mão que quer o braço. Não usa desodorante”. A problemática, portanto esta na origem da questão, como é comum acontecer, e aponta para o nosso entendimento e necessidade de autoridade política.

As autoridades religiosas são bispos, cardeais, o papa, etc.; as autoridades jurídicas são os juízes, promotores, desembargadores, etc.; as autoridades culturais são os escritores, compositores, cientistas, intelectuais, etc; os políticos não são autoridades, estão em cargos dotados de poder político. A posição em si não lhes pertence, chegam a ela única e exclusivamente por vontade popular. Os políticos são profissionais da política que ocupam posições de poder temporariamente objetivando atender as necessidades e reivindicações da população através da gestão da máquina pública, ou da ação legislativa. Na democracia a autoridade política soberana é o povo, os políticos estão a seu serviço.

Segundo os twitteiros que participaram da pesquisa os motivos pelos quais mantemos a idéia de submissão frente ao político relaciona-se com o “desconhecimento dos direitos dos cidadãos, só ensinam e exigem os deveres” conforme @Crivellari_MG, ou por “falta da real consciência popular do que é de fato cidadania”  segundo @Val_Ce, ou , “pela falta de cultura e educação que foi sempre colocada em 5° escalão, até quem sabe propositalmente pelo governo brasileiro!” opinião de @vfhcarvalho, ou porque “realmente interessa aos políticos e ao governo”, no parecer de @pegemorais1, ou ainda, devido a: “a) aspectos históricos; b) aspectos institucionais ; c) crise de valores”de acordo com  @roneymau. Como vêem as razões podem ser muitas, mas o certo é que não estão permitindo nosso amadurecimento político, e cabe a nós, os verdadeiros prejudicados, alterar esta realidade.



5. Solidariedade – fevereiro 2011


No Brasil das últimas semanas a solidariedade tem sido um tema bastante presente. A tragédia que viveram os moradores das cidades serranas do Rio de Janeiro sensibilizou seus compatriotas, não deixando nenhum indiferente ao sofrimento daqueles que viam morrer na enxurrada de lama seus familiares,  seus animais de estimação, e acompanhavam como a água levava seus pertences.
Os brasileiros, perplexos e irmanados, mais uma vez não decepcionaram, estiveram à altura das circunstâncias. Prontamente, ofereceram sua solidariedade enviando para os locais da catástrofe tudo o que foi solicitado, alimentos, roupas, medicamentos, doaram sangue e dinheiro. Muitos assumiram como responsabilidade pessoal contribuir de alguma maneira para minimizar o sofrimento daqueles que “vivam na carne” momentos de dor pelas perdas afetivas e material. Converteu-se em um compromisso nacional colaborar com as vitimas, participar da mobilização que crescia a cada seqüência exibida pela televisão, jornais, internet, rádio. O sentimento de fraternidade pairava sobre a sociedade, e para expressa-lo cada um cooperava como podia. Este compromisso, responsabilidade, dependência recíproca, mutualidades, que nos leva a uma atitude pró-ativa, desprendida é solidariedade. Sentimento que nos torna pessoas melhores, e a nível de grupo uma sociedade mais humana.

No plano social a solidariedade contém um sentido moral que vincula o indivíduo à vida, aos interesses e às responsabilidades de um grupo social, de uma nação, ou da própria humanidade. Trata-se de uma relação de responsabilidade entre pessoas unidas por interesses e motivações comuns, de maneira que cada elemento do grupo se sinta na obrigação moral de apoiar o(s) outro(s). (Dicionário Eletrônico, 1995)

A solidariedade existe também a nível pessoal, de uma pessoa para outra, independente das relações que as unem enquanto partícipes de um grupo social. A solidariedade integra a amizade. É aquela mão no ombro quando nos sentimos sozinhos, aquela palavra de apoio quando nos sentimos impotentes, aquele abraço forte em um momento de dor, aquela confiança inquebrantável quando nos sentimos inseguros. Perceber o outro, as pessoas próximas com quem convivemos em  família, entre amigos, no trabalho, dar-se conta de suas necessidades, limites,  fragilidades, angústias, muitas vezes é mais difícil que depositar uma quantia no banco para ajudar comunidades que sofrem tragédias. As necessita muitas vezes não são arroz ou açúcar, mas um olhar doce, um minuto de atenção, um beijo ao aparente acaso, pequenos atos de solidariedade que ajudam a viver, tanto para quem recebe, quanto quem os dá. Ambas as formas de solidariedade, esta ou aquela, são fundamentais para quem pretende ser feliz.

Falando em solidariedade gostaríamos de lembrar a todos que a única biblioteca do município de Muricipi no interior de Alagoas perdeu seu acervo nas enchentes que afetaram o Nordeste do país em 2010. Visando a reposição do acervo a direção da biblioteca criou uma campanha,  contando com a solidariedade das pessoas, editoras, empresas que possam e desejem. Desde então a campanha tem sido divulgada, sobretudo pela internet, e tem recebido a colaboração de muitos brasileiros, brasileiras e empresas para a restituição de um patrimônio fundamental na formação cultural dos habitantes de Muricipi, sobretudo de nossos jovens, agentes da manutenção de nosso crescimento como povo cidadão. Agradecemos a todos pela atenção e esperamos por sua SOLIDARIEDADE.

6. Pensando o processo – fevereiro 2011

Exponho abaixo, de forma panorâmica, minha visão sobre o processo das ideologias de esquerda, basicamente o PT, no Brasil. Minha reflexão não visa prioritariamente entender a trajetória do partido, mas sim, compreender a realidade a ser enfrentada pela resistência ao partido neste momento no país. Considerando ser uma percepção pessoal, logicamente apoiada em fatos, abro o tema à discussão com a finalidade de conhecer outras visões, sempre priorizando não a história, mas suas conseqüências na realidade e propostas de ação.
 
 A pretensão da esquerda marxista era a universalidade, pois apenas na universalidade o sistema poderia funcionar e crescer. O mesmo ocorre com o capitalismo, apenas na universalidade, ou globalização, ele pode manter-se e evoluir. Ambos os modelos buscavam a universalidade, e nesta disputa, muitas vezes avançando na esfera político-territorial, o capitalismo venceu. A queda do muro em 89 é o acontecimento simbólico da derrota do comunismo. Vivemos hoje na América Latina um "último suspiro" desta esquerda, já em uma versão mista com o capitalismo. Outra versão mista também esta na China, mas esta deu indícios claros na última visita do presidente chino aos EUA há 15 dias mais ou menos, que irá, mesmo que a seu ritmo, iniciar o processo de democratização. Está também o fechado regime da Coréia do Norte.  Considerando apenas um aspecto do modelo econômico a vitória do capitalismo sobre o comunismo não deixa espaço para a expansão de um partido de tipo petista (original e pretensão), exatamente pela impossibilidade de universalidade. A Europa, América do Norte, Japão, Rússia, Índia, entre muitos outros países, não retrocederão ao marxismo. Quero dizer com isto que, entre outras coisas, a pretensão do PT expandir-se pelo mundo, como demonstrou em sua política externa, não tem o menor futuro, ou seja, não se expandirá. A política exterior de Lula, sobretudo no final do governo (Honduras, Irã, caso direitos humanos de Cuba) não caiu bem na comunidade internacional. Lula ainda é a figura folclórica do operário que chegou a presidência, mas não alcançará nenhum posto de transcendência nos órgãos internacionais. A ausência de grandes figuras na posse de Dilma evidencia, entre outros fatos, a queda do prestigio internacional de Lula.

Intelectuais da esquerda especularam que o avanço da esquerda na América Latina poderia ser o indício de seu retorno, entretanto a qualidade de governo e os avanços sociais reais não sustentam esta expectativa. Há até uns 4 anos atrás as livrarias européias resgatavam escritores e escritos da esquerd (Marx, Gramsci, Marcuse, Lukács, Hauser, etc). Encontrava-se nas vitrines das livrarias estes livros com freqüência. Atualmente, já não se vê, em parte por que a crise passou a ser protagonista, mas também pela insustentabilidade do discurso de Chavez, Lula, ou Raul Castro e a difusão da resistência cubana, etc.

No mundo intelectual europeu o comunismo acabou em 1939 quando Stalin e Hitler assinaram o pacto de não agressão. Neste momento Stalin, líder comunista se equipara a Hitler, líder nazista, caindo por terra as pretensões de superioridade moral da esquerda. Ambos eram capazes de ser monstruosos, como de fato o demonstraram. De lá até 1989 foi a agonia do moribundo. 

Retomo as palavras do Frei Beto, quando disse que Lula conseguiu aquilo que a direita brasileira jamais havia conseguido, acabar com a esquerda no país, pois boa parte da intelectualidade de esquerda abandonou o PT. As pessoas que eram petistas na ilusão da justiça e igualdade social, ou por nostalgia da juventude revolucionária também abandonaram o PT. O partido hoje é dos aproveitadores, dos vigaristas, dependentes da compra de votos. Enfim, daqueles que tiram vantagem ou têm benefícios assistenciais. Poucos são os petistas por convicção, descontando o fanatismo. A intelectualidade brasileira não apóia mais o PT, foi o que ficou comprovado no Manifesto pela Democracia realizado no ano passado, e, senão me engano, a USP não votou PT nas últimas eleições. Ou seja, o PT perdeu as bases intelectuais que o apoiaram e deram sustentabilidade e legitimidade ao seu crescimento. A princípio, a morte do PT iniciou no mensalão. Digamos que o mensalão foi o nosso "pacto de não agressão". O mensalão demonstrou que a bandeira de superioridade moral levantada pelo PT era falsa, ele podia ser igual ou mais corrupto do que aqueles a quem criticava. No mensalão Lula/PT morreu moralmente. Entendo, por exemplo, que é este o motivo pelo qual o Diogo Mainardi não vê mais graça na política lulista/petista, perdeu o interesse, escrevendo inclusive um livro deste "fim de caso". A partir daí é apenas “más de lo mismo”, imoralidade, imoralidade,.... Neste sentido, o PT é inviável não apenas no sentido de expansão internacional da esquerda, mas também, e sobretudo, por sua decadência moral.  Assim, creio que o PT, como todos os partidos de ideologia marxista, estão vivendo no Brasil a agonia do moribundo. Corrobora nesta avaliação a alteração de rumo de Roberto Freire e o PPS.

A partir daí a questão passa a ser até quando nós poderemos suportar. O povo egípcio suportou 30 anos, a Venezuela já esta em torno de 15, a Espanha esteve sob o regime franquista até a morte de Franco (36 anos), a Itália, entre idas e vindas, esta há 10 anos com Berlusconi, nós estamos entrando no nono. Um aspecto que joga a nosso favor é exatamente a necessidade de universalidade do capitalismo, hoje mais do que nunca, pois já em fase de globalização, e a tendência, cada dia maior, dos países assumirem a democracia, conforme assistimos nas amplas manifestações populares nos países árabes.

Também não sabemos quanto o PT resistirá, até quando isto irá durar, nem o nível de desconstrução moral, política e econômica podemos alcançar. O estrago já é grande e vai aumentar. Colocar o limite dependerá da politização de nossa sociedade, de nossa organização  e mobilização, da organização, ação e ética dos partidos de oposição, em última analise do sentido de moral interiorizado pela nossa sociedade e da maturidade de nossa cultura política, tanto do povo quanto dos políticos (o que é dialético). Neste sentido, o quanto antes iniciamos o debate político, os questionamentos, a revisão de posturas histórica, pressões e manifestações, quanto melhor orientamos nossos debates e ações, a velocidade de organização, profissionalização e conscientização da importância de oposição, etc......melhor.


7. Alckmin pisou na bola feio – março 2011

Hoje é um dia de indignação! O Ministério da Cultura autorizou Maria Bethânia captar no mercado R$ 1.3 milhões para produzir um blog de difusão de seu trabalho. É ético um artista gastar tanto para colocar um blog no ar em um país como o Brasil? Entretanto o que me chamou mais atenção, e sobre o que quero tratar é a declaração do governador de São Paulo Geraldo Alckmin em visita hoje à Brasília onde disse torcer pelo governo Dilma.
Pessoalmente, ainda não havia engolido aquele apoio amplo e irrestrito dos governadores do PSDB ao governo Dilma expresso na Carta de Maceió. A explicação dos governadores, e de Alkmin, era a priorização do pacto federativo. Ora, o pacto federativo, mau ou bem, esta posto, e não é necessário que em uma reunião da oposição ele seja prioridade. O que ficou claro com relação à Carta de Maceió é que o PSDB, no caso seus governadores, não participariam da oposição ao governo exigida pelo eleitorado oposicionista, e responsabilidade de seu partido. Neste caso, o partido estaria dividido em dois: alguns se oporiam e outros não. Como isto funciona não me pergunte.
Passado algumas semanas de dita reunião FHC, em entrevista senão me engano a Kennedy Alencar, demonstra seu apreço a Lula, não como pessoa, mas como político. Também em entrevista FHC diz que Dilma começou bem seu governo. Diz isto mesmo depois de todas as negociações de cargo em troca de apoio realizadas pela presidenta, da incorporação de Palocci ao governo, da inação do governo frente ao caso Erenice Guerra o qual por sua importância, pois envolve a própria presidenta, deveria ser prioridade do executivo, da manutenção do aparelhamento de várias instituições públicas, e sobretudo, do significado de ter Dilma como presidente da república. Ou seja, uma pessoa que nunca concorreu sequer a uma vereança, basicamente desconhecida da população, é colocada no cargo mais alto do país pelas mãos de um homem que para alcançar seu objetivo não mediu esforços em termos de uso do dinheiro público e da máquina pública na campanha, da desobediência à legislação eleitoral inúmeras vezes, da ofensa às instituições e aos partidos, da mentira deslavada como foi o caso da "bolinha de papel" atirada na cabeça de Serra no Rio de Janeiro, etc. FHC desconsiderou completamente o que consiste em termos de autonomia do poder o fato, muito bem lembrado por Ferreira Gullar, de termos no cargo mais alto do país uma pessoa que não tem autoridade frente a outrem, no caso o ex-presidente. Temos aí o criador e a criatura, e todas as conseqüências inerentes a essa relação. Ainda assim, FHC só soube apoiar o discurso vigente na época que destacava como maravilhoso o novo governo baseado exclusivamente na discrição de Dilma, ou seja, confundia discrição com competência. Creio que FHC perdeu uma ótima oportunidade de elucidar quais seriam as ações do partido como oposição, não o fez, preferiu agradar o governo. Não encontro os motivos para isto, mas não posso interpretar de outra maneira.
Não contente o PSDB, que simultaneamente grita aos quatro ventos que fará (sempre no futuro) oposição ferrenha, lemos hoje a declaração de Alckmin que diz torcer pelo governo Dilma. As palavras textuais de Alckmin foram: “Torcemos por ela, pelo seu trabalho. Ela tem conhecimento das questões de Estado e conhecimento de gestão. São Paulo será parceiro nesse trabalho”. http://g1.globo.com/politica/noticia/2011/03/alckmin-diz-torcer-por-sucesso-de-dilma-na-presidencia.html
Penso que o governador foi muito infeliz em suas palavras por várias razões. Primeiro que esta confundindo torcer pelo país com torcer pela situação, embora não pareça são coisas muito distintas e com conotações também muito diferentes, as quais não devem escapar a um político experimentado como Alckmin. O governador não disse que torce pelo país, deixa claro que torce pelo governo. Segundo, os partidos de oposição constituem-se oposição porque tem uma proposta para o país diferente do(s) partidos de situação, portanto não concordam e não acreditam na eficiência do programa da situação. A oposição deve a partir daí mostrar à população em geral os equívocos desta proposta, segundo sua ótica, na condução do país, assim como as vantagens de seu programa. A oposição é critica ao programa da situação. No momento que um político da oposição diz torcer pela situação ele esta dizendo que espera que sua política seja boa para o país. Como? Ele não pertence à oposição que se diz contrária ao programa da situação? Ele não fez (ou seu partido) campanha contra este programa? Se a política da situação pode ser boa para o país, porque ele não faz parte da situação? Em outras palavras, porque ele se opõe? Em terceiro lugar, se o PSDB, pela voz de Alckmin, entende que a política da situação é capaz de ser exitosa, entendo torcer como desejar que seja vitoriosa, então o PSDB não é oposição. Entretanto, o PSDB e o próprio Alckmin disseram em outras ocasiões serem oposição. Opa! Tem algo aqui que não fecha e que teremos que pensar melhor, mas em outra ocasião para não sair da linha de pensamento deste artigo.
Em quarto lugar, Alckmin com esta declaração demonstra explicitamente seu apoio ao governo Dilma, e portanto a tudo o que ele envolve. Alckmin esta assinando embaixo do governo sobre o qual Álvaro Dias em recente entrevista no Twitter disse, “nunca na historia desse país houve tanta corrupção como nos últimos 8 anos”, assim como da incompetência na educação, saúde, segurança, infra-estrutura, etc. Esta reconhecendo a validade da aparelhagem do Estado, do uso de empresas públicas pelo partido de situação, da aliança do partido do governo com as oligarquias, da repressão à liberdade de expressão e busca de monopolização da informação. Diante de tal aberração só podemos concluir que Alckmin e conseqüentemente seu partido estão completamente confundidos com o que é ser oposição e como fazer oposição. Não tem a menor idéia do que isto significa. São “barcos” ao sabor dos ventos que navegam a deriva. Situação cada dia mais preocupante.
A irresponsabilidade política da declaração de Alckmin é imensa!
A inconseqüência da declaração de Alckmin beira a insanidade!
Alckmin não tem noção das conseqüências de seus pronunciamentos como governador do estado mais rico da União, político de destaque e peso no maior partido da oposição do país?
Alckmin nunca "escutou" o eleitorado do PSDB que exige do partido oposição constante, firme e profissional? Se é assim em que mundo ele vive?
A situação é séria, mas o PSDB continua brincando.


8. Analise do discurso opositor – março 2011

Na semana passada publicamos um artigo sobre o discurso político de Geraldo Alckmin intitulado Alckmin pisou na bola feio http://t.co/vzODGkz Ontem, 29 de março, o governador foi entrevistado na rádio do Jornal Estado de São Paulo http://tinyurl.com/688bdyd e um dos temas abordado foi sua postura como oposição, o que ofereceu um rico material para apreciação de seu pensamento ao qual não pude resistir à tentação de interpretar. A seguir exponho a análise crítica realizada tendo consciência de minhas limitações, pois não sou analista ou cientista política nem estudiosa do assunto. Sempre que escrevo, o faço como uma brasileira, eleitora preocupada com os rumos que nosso país, a qual expõe suas apreciações sobre temas políticos de forma despretensiosa.

A política assume o protagonismo na segunda metade entrevista. Em uma das primeiras perguntas Alckmin oferece uma explicação para as dificuldades de se exercer a oposição no Brasil, diz o governador:

Não é fácil ser oposição no Brasil. Num país cujo sistema político é montado de tal maneira que não há salvação fora do governo. O que todo o mundo quer é aderir ao governo, porque a realpolitik estabelece isto, a política é feita incrustada na máquina pública, mas o PSDB fará oposição.

É possível que os regimentos e regulamentações das ações políticas no Brasil tenham peculiaridades que dificultem a atividade oposicionista, entretanto não a impede, pois o PT realizou uma oposição ferrenha ao governo FHC como todos sabem. Não estamos aqui falando da forma ou dos critérios da oposição, mas das possibilidades reais e legais de realizá-la. Se o PT encontrou espaço para fazer oposição, porque a atual oposição não consegue?
Em nenhuma democracia do mundo a oposição conta com a máquina pública. A máquina pública é gerenciada pelo partido de situação, que logicamente impedirá que os partidos que desejam substituí-lo sejam beneficiados por ela. Entende-se que ter a máquina pública a seu favor facilita as atividades, mas me parece inerente ao conceito de oposição saber agir sem este suporte.  Pode-se interpretar as palavras de Alckmin como o que de fato acontece é que o PSDB não sabe fazer política sem a máquina pública, e neste caso, não sabe fazer oposição. Neste caso, o problema é do partido não do sistema político nacional. Se a atividade opositora deve ser independente da máquina pública porque todo mundo quer aderir ao governo, conforme diz Alckmin? Considerando que a não disponibilização da máquina pública é uma premissa de ser oposição, poderia entender-se que os opositores buscam manter-se sob o manto governamental não para exercer a oposição, mas pela continuidade dos benefícios pessoais que dele possam usufruir. Não me parece que este seja o caso do governador, mas entendo oportuno atentar para esta possível interpretação do fato.
Alckmin diz no final da resposta que o PSDB fará oposição, aqui cabe a pergunta: Como o PSDB fará oposição sem a máquina pública? Sugerimos que os atuais partidos de oposição busque alternativas de ação, como por exemplo criar canais permanentes de comunicação com a grande mídia, promover trabalhos de base, agilizar a organização interna, etc....

A forma de realizar oposição é outro tema recorrente nas declarações oposicionistas. Sobre este assunto Alckmin afirma: Nós somos oposição, vamos exercê-la, apenas não fazemos de forma raivosa como o PT fazia na época do FHC.

O eleitorado do PSDB nunca pediu ao partido que fizesse uma oposição raivosa, e sim que faça oposição, por conseguinte não tem sentido que os políticos do partido sigam repetindo à exaustão que não farão este tipo de oposição. O que o eleitorado do PSDB solicita é uma oposição firme, profissional e permanentemente atenta. Nenhuma destas características relaciona-se com raivosa.  A insistência neste argumento parece ser apenas mais uma justificativa vazia de por que o PSDB não exerce seu dever e direito democrático. A oposição que queremos é que o partido se entregue unido à tarefa oposicionista, tenha um discurso claro, vá direto ao assunto, diga com todas as letras o que e porque esta criticando/fiscalizando, quais são as propostas do partido em cada caso. Para tanto, não é preciso ser desrespeitoso, ofensivo e muito menos ir contra o que é bom para o país. As ações positivas realizadas pela situação não necessita ser tema do discurso oposicionista, a situação se encarregará de divulgá-lo e enfatizar suas qualidades. A oposição deve ser onipresente, expressar seu parecer com relação a todos os assuntos sobre os quais o governo mereça ser fiscalizado e criticado. Atualmente, assim como nos últimos oito anos, não foi esta a postura de nenhum partido da oposição.

Seguindo a entrevista Alckmin visa explicar qual é sua função como governador de oposição dentro do sistema federativo brasileiro:
Uma coisa é a luta política, outra coisa é o governo. O Brasil é uma república federativa. A federação impõe uma cooperação dos entes federados. Então eu como governador de São Paulo não fui eleito para fazer oposição ao governo Dilma. Eu tenho o dever de ter uma cooperação com o governo federal independente de sigla partidária. Agora, sou do partido de oposição, donde tiver o PT nós vamos estar do outro lado.

Aqui, sob meu ponto de vista, o governador demonstra que tem uma visão equivocada sobre sua postura política. Entendo que no momento em que separa política e governo ele exige que a pessoa que encarna esta simultaneidade opte por uma das posições, ou política, ou governo. Assim, ele como governador de um partido de oposição ao governo federal não tem como conciliar as duas posições, ou se alia ao Planalto para governar, ou age como oposição. Segundo o governador não há possibilidade de harmonizar ambas as posições. Neste caso, Alckmin esta dizendo que no Brasil os governadores de oposição não devem opor-se politicamente ao governo federal. Conseqüentemente, os partidos de oposição no país estão destinados a estarem definitivamente divididos, os governadores falarão bem do presidente e os demais deverão criticá-lo e fiscalizar-lo. Em termos de mensagem ao povo/eleitorado como funciona esta divisão, na qual parte do partido tem um discurso e a outra parte tem um discurso inverso? Como funciona um partido no qual parte do partido elogia o governo e a outra parte critica? Com este perfil o partido oferecerá uma mensagem clara ao povo/eleitor? Esta é situação atual, por um lado Alckmin, Anastásia, Perillo são só elogios ao governo e a presidente, por outro Serra e Dias criticam. Qual é a ideologia deste partido?

Me parece óbvio que, por uma questão de clareza,  unidade e princípios ideológicos, aspectos fundamentais na política, um partido deve ter em todos os níveis um mesmo discurso e uma mesma posição frente aos seus eleitores e opositores. Um partido cujo seus quadros tenham discursos opostos guarda dentro de si uma contradição a qual inevitavelmente o levará ao fracasso. Portanto a questão não esta em separar as duas posições, governador e político de oposição, e sim conciliar, pois na pratica esta situação pode recair na mesma pessoa, a qual não pode abrir mão de nenhuma das duas posições.  O governador, cargo da administração pública terá com o governo central uma cooperação administrativa, jamais uma submissão política, pois esta significaria uma traição a seus seguidores. No campo da administração pública ambas as esferas, estadual e federal, trabalharão em permanente colaboração visando o beneficio do povo, funções para as quais foram eleitos. No âmbito político estarão presentes as diferenças ideológicas e propositivas inerentes da oposição política. Os governadores manterão o discurso coerente com as posições de seu partido e do eleitorado que o elegeu.

Chegando ao final da entrevista o repórter perguntou qual a avaliação do cidadão Geraldo Alckmin dos primeiros 100 dias do governo Dilma. A resposta do governador foi a seguinte:
Acho que é muito cedo pra gente estar fazendo analise de governo, mas acho que ela começou bem intencionada, na política internacional corrigindo alguma coisa que precisava ser corrigido. A conversa que tivemos sobre os temas de interesse de São Paulo (...) É bom para o Brasil que ela vá bem.

Nesta resposta vejo dois aspectos a serem destacados, ambos reincidentes. Primeiro, é saber quando o PSDB vai iniciar sua oposição. Alckmin sugere inclusive na entrevista que se pode avaliar um governo apenas no seu final. Também afirma em mais de uma ocasião ser oposição, entretanto sempre encontra um motivo para não exercê-la, ou é cedo, ou ele é governador, ou devemos torcer pela presidente. Ser oposição, não é nomear-se como oposição, é exercer uma postura contraria ao governo, é fiscalizá-lo e criticá-lo aberta e diretamente. Os políticos do PSDB adiam sempre para o futuro a virtual oposição do partido, discurso este que estamos ouvindo desde o primeiro governo petista. Iniciamos há poucos meses o terceiro governo petista e o PSDB segue repetindo as mesmas justificativas para sua incompetência como oposição.  Tal postura demonstra que também o PSDB não escuta seu eleitorado, esta distante de suas bases, não demonstra capacidade de autocrítica e revisão de posturas.
Em segundo lugar, mais uma vez, Alckmin vê bem o início do governo Dilma, mesmo depois de sua proposta inconstitucional para definir o salário mínimo por decreto, ou a pressão do governo para o aparelhamento da Vale Alckmin entende que a presidente esta bem intencionada. Fica difícil entender onde Alckmin e o PSDB querem chegar com discursos e posturas contraditórias, ambíguas e superficiais. 

9. A força latente – abril 2011

No primeiro domingo de setembro de 2010 o Brique da Redenção, feira dominical de arte, artesanato e antiguidades tradicional de Porto Alegre estava repleta de gente. Em período eleitoral o número de pessoas aumenta, pois partidos e coligações montam suas barracas e trazem seus filiados e gente paga para fazer campanha. O Brique incorpora historicamente, junto a sua função principal, um componente político. Fotos de Dilma ao lado de Lula e Tarso se vêem de longe, são grandes e vistosas. Surpreendentemente, não se vê fotos de Serra, muito menos com Yeda, candidata à reeleição para governadora, e também do PSDB. Ninguém faz campanha para Serra, ele entra, quando entra, de lambuja na campanha de outros correligionários. Nesta mesma época visitei mais três ou quatro cidades do interior do Estado. Em nenhuma vi sinais de campanha para Serra. PDT, PMDB e PT monopolizavam a paisagem das cidades, do PSDB nem sombra.  Mais tarde li no blog do jornalista Políbio Braga, sempre muito bem informado, que, basicamente, não houve campanha para Serra no primeiro turno no RS, confirmando minha percepção daquela realidade.

A campanha de Serra para presidente foi problemática em vários sentidos. Sobre alguns nós já conversamos, como a escolha da estratégia de marketing, a ausência de um discurso firme e consistente de oposição, a falta de unidade no partido enfatizada em Minas onde Aécio fez corpo mole na luta por Serra no primeiro turno ganhando força o voto Dilmásia (Dilma + Anastásia), o isolamento de Yeda pelo partido no RS, etc. Este quadro constituiu o fechamento de oito anos de ausência de oposição frente ao governo Lula. Neste período os partidos opositores tiveram alguns momentos brilhantes como a derrota do governo na renovação da CPMF, mas tais momentos foram raros. A oposição foi apática, e como tal, conivente com os abusos de poder e incompetência do lulapetismo.

Do outro lado, em compensação, tudo era exuberante. Dilma sai como candidata da situação, não oficial, em meados de 2009. Submete-se a uma operação de estética facial, acompanha Lula em eventos públicos, Lula fala nela sem querer querendo sempre que pode, tem-se a idéia de que a campanha começou para o PT antes do tempo permitido. Nas negociações regionais Lula prioriza o apoio à candidatura ao Planalto. A campanha para a situação era nada mais que a extensão de uma prática mantida durante todo o governo, pois o ex-presidente jamais desceu do palanque. Começa a campanha pra valer e o dinheiro sobra para os petistas, a máquina pública esta a serviço da candidata do governo, o presidente dentro e fora de expediente faz campanha explicita para sua pupila. Diz que fará por Dilma mais do que faria por si mesmo nesta eleição. Procedimentos ilegais abundaram no lado da situação, mas a justiça não teve coragem de punições consistentes e o circo seguia. Tivemos dossiês, agressões, despotismo, que foram engolidos pela onipresença de Lula, pela negligência da oposição e da justiça. Segundo o discurso governista o país era outro após os oito anos de lulapetismo, como nunca antes havia sido, tratava-se de um desabrochar, funcionava com perfeição, a economia em alta, o bolsa família ampliava-se, o povo consumia e regozijava-se. Popularidade inédita do presidente nas pesquisas. Situação dava como certa vitória no primeiro turno, oposição nunca acreditou que venceria.

Situação e oposição foram surpreendidas logo nos resultados das urnas no primeiro turno - haveria um segundo turno. O PT sente o baque, o prestigio de Lula é afetado, o partido cambaleia nos primeiros dias, para reagir depois. O PSDB reorganiza sua logística regional, rearticula-se politicamente, Aécio adere, de fato, à campanha, os tempos na TV se igualam, e o resultado do segundo turno é novamente surpreendente. Ganhou Dilma, mas a diferença não é a que o PT e Lula esperavam. Dilma recebe 55.752.529 votos e Serra 43.711.388 votos.

Acima descrevi um panorama conhecido, mas o fiz visando identificar novas interpretações sobre estes acontecimentos. Ao estabelecer um paralelo entre as atuações da situação e da oposição durante os últimos oito anos, incluindo as campanhas presidenciais, destaca-se a superexposição da primeira frente à omissão da segunda, e neste caso a proximidade dos resultados eleitorais é ainda mais instigante. Como uma oposição desestruturada, que enfrenta eternas e profundas disputas internas, sem trabalho de base, incapaz de assumir seu papel no jogo democrático alcança resultados semelhantes ao do carismático e mediático Lula que vence apenas no segundo turno?  Se é assim não posso deixar de pensar no que teria ocorrido se a oposição agisse conforme deve: fiscalizar, criticar o governo e propor alternativas sempre visando a melhoria da qualidade de vida do povo. Provavelmente, teria ganho as eleições.

Pode-se despreender daí que a derrota da oposição tem muito mais a ver com sua própria debilidade, do que com a famigerada invencibilidade do PT de Lula. Parece que a popularidade, a aprovação e o carisma do ex-presidente não têm a dimensão que muitos lhe atribuíram. Talvez sejam apenas mais uma construção mediática como muitas outras criadas e difundidas em seu governo e que hoje vemos desmoronar uma atrás de outra. É possível que sua invencibilidade eleitoral tenha sido apenas uma estratégia de marketing exitosa, pois manteve seus adversários amedrontados frente a ela, mesmo que a realidade oferecesse uma infinidade de argumentos para o contra-ataque. Neste caso, os eleitores foram muito mais sagazes que os próprios políticos e conseguiram ver atrás da cortina de ilusões apresentada pelo discurso governista. Não quero dizer com isto que Lula não seja carismático, apenas ressalto que esta característica unida a um contexto dito como favorável não foi suficiente para obter o voto de grande parcela da população brasileira.

Esta visão demonstra que houve no campo político brasileiro nos últimos oito anos uma super valorização da fortaleça política do PT, e paralelamente um processo de desmontagem da oposição, caracterizado pela marginalização política de FHC e as obras de seu governo. O engrandecimento do PT e a desvalia da oposição, sobretudo do PSDB, pois governo anterior e maior partido da oposição são ações que fazem parte da engrenagem armada pelo PT visando o desmantelamento do sistema democrático a partir do enfraquecimento do confronto das forças opositoras exigidas pelo modelo, e do enaltecimento do partido único, símbolo do autoritarismo.

Observa-se, a partir de uma leitura um pouco mais atenta, que os partidos de oposição deixaram-se intimidar pelo novo jogo político no cenário nacional resultante da chegada ao governo do PT, foram capturados pelas artimanhas petistas que objetivam o esvaziamento da oposição como força política, e a imposição do PT como partido hegemônico. Penso que os números da última eleição, tanto os que se referem à candidatura para presidência, quanto a votação para governadores, demonstram a capacidade de discernimento do povo na leitura da realidade não se deixando enganar pela postura imoral, anti-ética e anti-democrática do PT, assim como por seu discurso desonesto e desrespeitoso para com a população. Neste sentido, a política da oposição deve ganhar autonomia, estrutura e caráter próprio, acreditar na sua capacidade e eficiência, deixando de ser balizada pelo PT, pois o partido governista tem “pés de barro”. O povo brasileiro ofereceu sinais evidentes sobre seu desejo de uma oposição forte e profissional. Esperamos que nossos políticos não nos desapontem!



Pensando os partidos políticos – maio 2011

Dias atrás no Twitter o jornalista Raul Christiano me sugeriu que escrevesse um texto sobre a organização partidária. Aceitando a sugestão dou início à tarefa, pois entendo que estamos em um momento oportuno para o debate sobre os princípios, funções, objetivos, ética, e estrutura adequada para um partido político no Brasil. Devo esclarecer que não tenho formação nas ciências políticas, assim como não trabalho na área, mas aceito o risco de atrever-me a iniciar esta discussão a partir da exposição de alguns aspectos a serem considerados na abordagem do tema.

Inicialmente, introduzo alguns dados teóricos imprescindíveis para que possamos nos entender, ou seja, para que todos entendam da mesma maneira os termos fundamentais.  Como trataremos de partidos políticos, creio que vale a pergunta: O que é um partido político? Poderíamos definir partido político como uma organização de direito privado criada através da união voluntária de pessoas com afinidades político-ideológicas, detentora de recursos e estrutura compatíveis com sua função, que visa contribuir para amadurecimento político da sociedade, e, através da qual se alcança o poder político.

Segundo a definição acima o elemento agregador de um partido são as “afinidades político-ideológicas. A disputa pelo poder também é importante, mas ela adquire legitimidade ao tratar-se de uma luta para a implantação das propostas ideológicas defendidas pelo grupo. Portanto, deve ser uma luta pelas idéias não pelo poder em si. O debate com a sociedade decorrente da defesa das convicções político-ideológicas do partido contribuirá para o amadurecimento político de todos, políticos e povo, implicando diretamente no fortalecimento da democracia. A pluralidade ideológica é uma característica da democracia. A politização do povo, uma das funções dos partidos políticos, uma exigência da construção da cidadania. Portanto, os partidos políticos têm importante papel na construção e qualificação da democracia.

Nesta definição dois termos merecem maior atenção: política e ideologia. Busquemos um breve esclarecimento sobre eles. A filósofa alemã Hannah Arenth, autora de vários trabalhos publicados sobre política, afirma que esta “baseia-se no fato da pluralidade dos homens, portanto, ela deve organizar e regular o convívio dos diferentes e não dos iguais”. Para Arenth a política é a ciência da organização da sociedade considerando a diversidade de seus membros e a complexidade, cada vez maior, de suas necessidades e atividades. De forma ampla, a política trata da organização da convivência de um grande grupo – sociedade de um país. A concentração de pessoas que cria as cidades exigiu estabelecer regras de convívio, aprofundar a organização da coletividade considerando esta nova forma de vida – urbana - oposta a vida rural anterior, daí nasce a política – pólis (cidade na Grécia antiga). As formas de organização podem ser: regime democrático, autoritarismo, monarquia, etc.

Ideologia é um conjunto de idéias próprias de um grupo, de uma época, ou que traduzem uma situação histórica. Ideologia pode ter um significado amplo relativo à visão de mundo. Neste caso ideologia/visão de mundo constituem o conjunto de parâmetros/conceitos com os quais vemos/interpretamos o mundo. O termo ideologia pode também ter sentido restrito, entre eles o político. Ideologia política é o conjunto de idéias que determina qual a visão política de um grupo, ou seja, seu entendimento sobre como a sociedade deve ser organizada. As ideologias políticas podem ser: a social-democracia, o comunismo (socialismo), nazismo, fascismo, etc.

Assim, como parte da organização política da sociedade os partidos têm a função de agrupar sob suas siglas as diversas ideologias existentes no tecido social. Os partidos políticos devem ser a expressão da pluralidade dos ideários políticos – ideologias - contidas no povo. Cada partido representará o pensamento político de uma parcela da sociedade.

Como representante das diversas ideologias os partidos políticos assumem funções na sociedade, das quais aponto algumas que julgo importantes:
1. Promover a formação política dos cidadãos visando sua participação direta e ativa na vida política do país;
2. Contribuir para os esclarecimentos necessários para o exercício das liberdades, direitos e deveres políticos do povo;
3. Promover o estudo e o debate dos problemas da realidade política, econômica, social e cultural, nos âmbitos municipal, estadual, nacional e internacional;
4. Apresentar e debater com o povo seus programas, elaborados a partir do conhecimento/discussão da realidade, e dos distintos ideários políticos representativos das forças vivas da sociedade;
5. Apresentar candidaturas para os postos eletivos visando à possibilidade de execução dos programas do partido discutidos e aprovados por seus correligionários e órgãos responsáveis;
6.  Quando oposição, fiscalizar, criticar, denunciar e propor alternativas ao programa da situação, objetivando manter permanentemente ativo o ideário da parcela da população circunstancialmente não representada no(s) executivo(s);
7. Promover os direitos, deveres, liberdades fundamentais, e a preservação das instituições democráticas.

Como vemos os partidos políticos detém significativo papel na sociedade, pois devem atuar desde a formação do cidadão como agente político, passando pelo debate da realidade e dos programas de governo, alcançando à possibilidade, através da candidatura para cargos eletivos de realizar as propostas ideológico-programáticas. Para tanto, como se pode imaginar, é fundamental que os partidos tenham uma organização/estrutura compatível com sua importância política e execução eficiente de suas funções. A estrutura partidária deve ser autônoma, e sua organização ética, transparente e competente. Na busca de uma boa organização/estrutura entendo que um partido não pode prescindir de três aspectos fundamentais: liderança, unidade e profissionalismo.

Liderança: Segundo alguns autores, o líder é aquela pessoa que detém um conjunto de qualidades e capacidades que a possibilitam influir e motivar outras pessoas. Dentre estas características destaco: visão, criatividade, confiança em si, honestidade e humildade.  Tendo conhecida e reconhecida sua capacidade e integridade moral, as pessoas passam a confiar e seguir o líder construindo uma relação onde ambos os lados se desenvolvem e avançam em seus princípios e objetivos. A existência de uma liderança contribui para a organização e unidade do grupo, aspectos imprescindíveis para qualquer organização e conseqüentemente também para os partidos políticos. A liderança, qualidade do líder, detém, não por imposição, mas por prestígio a prerrogativa de agir nas disputas internas, nas situações de conflito, no resgate do rumo, na motivação ao trabalho, na orientação das metas, no fortalecimento dos princípios, etc. Enfim, a atuação do líder é fundamental na organização e direção de um partido político. Sem um líder ativo uma organização tem poucas possibilidades de ser exitosa.

Unidade: O espírito partidário é outro aspecto fundamental de unidade do grupo, pois através dele insere-se a prevalência das convicções, objetivos e interesses do partido sobre os interesses pessoais, ou seja, valoriza as idéias e objetivos comuns e não os individuais. A comunidade partidária deve estar congregada na defesa de seu ideário e programa. A convicção de que a ideologia e as propostas de ação (programas de governo) podem melhorar a organização e qualidade de vida do povo é um importante elemento aglutinador de um partido político.

Profissionalismo: O termo profissionalismo, segundo vários dicionários, significa o “procedimento característico dos profissionais”.  Quais são estes procedimentos? As respostas encontradas para esta pergunta não são muito claras, mas basicamente indicam uma postura que reúna seriedade, inteligência, eficiência, pontualidade, agilidade, organização, criatividade, interação, domínio do conhecimento sobre o tema específico, atualização constante. Estas qualidades são válidas tanto a nível pessoal, quanto coletivo, organizacional. Neste sentido, estas características são importantes para as organizações políticas – partidos. Um partido político deve ter uma atuação profissional, ser competente em suas atribuições, devido sua complexidade e compromisso moral com a população. Considerando as especificidades dos partidos políticos destaco alguns aspectos que me parecem relevantes:
1. Mapeamento: o partido político deve ter identificado todos os seus membros, políticos, militantes, filiados, funcionários. O mapeamento possibilita o conhecimento das pessoas que o integram, dados básicos,  localização e distribuição no território nacional, enfim o mapeamento proporciona adquirir uma visão global do partido;
2. Organograma: o partido deve ter uma estrutura de diretórios regionais e nacional de forma a abranger todo o território nacional, possibilitando a todas as pessoas que se identificam ideologicamente participarem de suas atividades;
3. Comunicação interna: a internet facilita a comunicação em um país das dimensões do Brasil. Os partidos políticos devem manter uma comunicação permanente entre os diretórios entre si, entre as regionais e o direção nacional, assim como entre partido e militantes/filiados. A comunicação interna deve facilitar a difusão de informações, documentos, programas de atividades, etc. fomentando a integração de seus participantes;
4. Comunicação externa: tanto como situação, e, sobretudo como oposição, os partidos políticos devem ter uma estrutura autônoma de comunicação direta com a população. Os partidos opositores, para os quais a máquina pública não esta a disposição, devem contar com os elementos necessários para que sua voz alcance a totalidade da população de forma permanente e profissional. Estes elementos podem ser: através dos meios digitais (blogs, sites, redes sociais, etc.), ou tradicionais (assessoria de comunicação (a qual o partido deve oferecer material de trabalho constante), porta-voz, espaço físico apropriado nos diretórios para receber jornalistas, dar entrevistas, depoimentos, denuncias, etc).
5. Trabalho de base: os partidos políticos devem exercer seu compromisso com a sociedade de contribuir na formação e debate político. Neste sentido, os partidos devem realizar um trabalho permanente junto à população de iniciação, esclarecimento, e debate político-programático objetivando o fortalecimento da cidadania e democracia.

Penso que o significado e a complexidade dos partidos políticos ficam mais ou menos esboçadas, assim como a sua função principal, organizar a sociedade a partir de idéias compartidas visando o fortalecimento moral e a melhoria constante da qualidade de vida de todos. Espero que as idéias expostas possam contribuir para a reflexão e debate sobre o tema.     

Horacio mais de 150 do que o normal blog.

Telhado de Barro – maio 2011

Telhado de barro lembra muita coisa. As antigas cidades mineiras. As casas térreas e sobrados de Parati. Os casarões de Santa Teresa. O telhado das casas simples espalhadas pelo Brasil, das casas dos pescadores, do sertão, dos campos. As cores são nossas, cor da terra ensolarada. As telhas são coloniais ou francesas. Quando dividido em dois o telhado é básico, direto, parte das águas cai para um lado, parte para o outro. Não precisa mais. Gilberto Freire já dizia que a casa brasileira é um elemento de unidade nacional.

Telhado de barro faz pensar em uma proteção simples, sem luxo, o necessário, o indispensável, o mínimo. Mas não é um mínimo qualquer como aquele que se contenta com qualquer coisa. È um mínimo justo. É a medida exata, sem parecer ambicioso nem inferior. É a sensação de aconchego conhecido, forte por sua contundência, profundidade, de ter o digno. Estar abrigado das chuvas e trovoadas, do ar frio das noites, do sol intenso, da luz que cega. Estar na sombra, na zona de conforto.

Telhado de barro não é o mesmo que telhado de vidro. Telhado de vidro significa estar exposto, fragilizado, ter culpa no cartório e por isto estar deslegitimado para a crítica. Telhado de vidro é vacilante, te protege da chuva, mas não do sol inclemente, nem dos curiosos. O telhado de vidro não produz privacidade. Telhado de barro, ao contrario, é um lugar seguro, confiável, autêntico. Expressa casa,.......lar, refugio, aconchego despretensioso de alguém que é feliz com as coisas simples, festeja mais o conteúdo do que as formas, daqueles que valorizam o que esta dentro mais do que o que aparece.

Esta reflexão que joga com as palavras, brinca com os significados, levanta hipóteses, resgata lembranças, introduz ditos populares quer ser uma homenagem a este blog que nasce de nosso amigo Nélio. Seguindo as trilhas semânticas no nome por ele escolhido - Telhado de barro - quem sabe podemos adentrar um pouquinho em seu coração generoso.

Muito sucesso Nélio!!!!!

10. Nossa democracia clama pelas camadas médias

junho 2011                                                                                                                                                              

A cidadania, entendida como a consciência do compromisso de cada um de nós com relação a todos os aspectos que interferem na vida nacional, pode ser exercida de várias formas. Não obstante, um dos símbolos marcantes desta condição coletiva de interferir diretamente nos rumos de um país é a manifestação popular nas ruas. A manifestação popular, espontânea ou organizada por instituições da sociedade civil, é a imagem mais forte do povo unido que assume sua liderança na democracia, expressando diretamente em primeira pessoa, suas reivindicações, criticas e propostas. Assim como a eleição, a manifestação popular reforça a democracia e o papel do povo no centro do debate e das decisões políticas, simboliza a responsabilidade e a força de uma sociedade madura. É desnecessário dizer que esta prática participa do cotidiano de todas as sociedades europeias e dos milenares povos orientais.

No Brasil, entretanto, existe uma grande resistência da população em manifestar-se coletiva e publicamente. Sabemos que o governo petista cooptou as habituais instituições de protesto popular como a UNE e os sindicatos. Logicamente, esta circunstância dificulta a organização social, mas sabemos também que a pratica de manifestar-se não participa de nossa tradição política, e os motivos pelos quais mantemos esta postura anti-cidadã não estão claros. No presente artigo gostaria de refletir sobre este tema objetivando entender melhor nosso comportamento político enquanto povo, embora tenha consciência do quanto é delicado o assunto no qual me adentro. Esclareço que o conteúdo aqui apresentado é resultado de leituras e observações, mas não foi submetido aos parâmetros de um trabalho científico.

Nas sociedades onde predomina a cultura rural é comum uma divisão social dicotômica e antagônica. Por um lado os donos da terra, detentores do poder político, econômico e cultural; por outro uma maioria de trabalhadores rurais, dependentes econômica e politicamente dos primeiros. Estes necessitam tanto laborar nas terras do grande proprietário para sobreviver, assim como carecem de sua proteção e bendição. De forma bastante breve, esta é a realidade socioeconômica brasileira desde o descobrimento até bastante entrado o século XX, e em algumas regiões ainda permanece. Desde as Capitanias Hereditárias e seus donatários, passando pelo ciclo da cana de açúcar no litoral, até as fazendas de gado e café do Sul e Sudeste, observa-se a reprodução contínua deste modelo. A figura do latifundiário, paternalista e escravocrata estendeu-se por todo o país. Ao poder econômico originado no campo agrega-se o poder político. O período emblemático desta situação é a “política do café com leite” nos primeiros quarenta anos da República. No Brasil esta estrutura chegou a uma situação extrema, pois ao dono da terra se contrapõe a figura do escravo africano, seres humanos tratados exclusivamente como instrumento de trabalho. Os poucos trabalhadores livres, comerciantes, etc. dos primeiros séculos deveriam integrar-se ao sistema para sobreviver, o que significava submeter-se à elite latifundiária.  Neste sentido, a dicotomia, o antagonismo e a hierarquia constituem a gênese da organização socioeconômica do Brasil.

Esta situação começa a alterar-se no final do século XIX com o crescimento das cidades, a incipiente industrialização no Sudeste, a Proclamação da República, a abolição da escravatura, e a chegada dos imigrantes europeus como trabalhadores assalariados. Todos estes aspectos estão relacionados com a idéia de modernização de raiz europeia, que preconiza a urbanização, a industrialização, a democracia, o liberalismo econômico como condições para alcançar o progresso, e como consequência o desenvolvimento de uma camada média da população. Assim, as classes médias são resultado do processo de modernização introduzido no país. Entretanto o desenvolvimento e organização deste setor não tem sido fácil devido a sua recente trajetória e a instabilidade econômica e política que acompanha a história da República.  Nestas condições esta parcela da população segue insegura com relação ao seu caráter e posição sociopolítica. Como expressão desta postura vacilante observa-se a dificuldade da construção de parâmetros claros que lhe permitam obter uma identidade própria. Neste contexto nossas camadas médias se equilibram entre os dois polos, as camadas baixas e altas, tanto no sentido econômico, quanto no sentido de identidade cultural, a qual inclui a política.

É um clássico dizer que as camadas médias se espelham na elite, mas em nosso país esta máxima adquire ainda maior peso considerando a contundência histórica da dicotomia, antagonismo e hierarquia no campo social, sua fragilidade e a ausência de nitidez quanto ao seu papel político na sociedade. Estes aspectos demonstram a existência de uma dificuldade de definição conceitual das camadas médias no Brasil, o que as impede de assumir uma posição autônoma na dinâmica política. Tendo em vista este contexto, sua opção foi privilegiar um comportamento que a distancie das classes baixas e as aproxime das altas.
 
Corrobora para esta conclusão de base histórica o discurso recorrente de integrantes das camadas médias brasileiras quando indagados de porque não participam de manifestações populares. As respostas costumam ter um teor semelhante a: “quem faz passeata é petista”(leia-se camadas baixas), “as pessoas bem postas não necessitam sair à rua para manifestar-se”, ou “se manifesta quem não tem o que comer”, “uma pessoa de bem não participa destas coisas”, e por aí vai. Estes comentários demonstram claramente a mentalidade elitista e hierárquica dos entrevistados, pois indicam que a manifestação popular é uma atividade para os necessitados, aqueles dos quais as camadas médias desejam afastar-se. A não identificação com as camadas baixas é uma luta constante das classes médias brasileiras, pois manter o status não é uma tarefa fácil em um país em constante turbulência econômica e política. Paralelamente, ao afastar-se de um extremo ela aproxima-se do outro extremo, as camadas altas. Logicamente, a cercania com a elite é interessante para as camadas médias, tanto por razões praticas (profissionais, sociais, etc.), quanto por razões simbólicas. Entretanto, ao avaliar a questão política a partir da imagem social e ganhos pessoais, as camadas médias abrem mão de sua capacidade qualitativa e quantitativa de intervir na movimentação política do país segundo seus interesses.  

Parte do problema reside na ausência de caráter das camadas médias no país, determinado pela peculiaridade de suas características, problemática, contexto, reivindicações, expectativas, filosofia, etc. Estas devem contribuir para o avanço do conjunto da população, mas contêm perspectivas e exigências próprias relativas ao seu modus de vida. Sua luta deveria ser neste sentido, mas não é, pois a identificação com as camadas altas retira-lhes o foco do combate em prol de suas necessidades, princípios, projetos e soluções para os seus problemas específicos.  Seu espaço no cenário político fica vazio. As camadas médias passam a constituir uma força política em potencial, mas inerte, abafada por sua própria inconsciência. 

É bem verdade, que as camadas médias brasileiras encontraram nos últimos tempos um meio de expressão, a internet. Esta ferramenta tem sido amplamente utilizada por esta parcela da população para mostrar sua indignação e repúdio à política atual, sobretudo a partir das eleições de 2010, e verifica-se que tem obtido bons resultados. Logicamente, a movimentação política via internet é positiva e tem demonstrado nos quatro cantos do mundo sua eficiência, além de sua contemporaneidade. No Brasil, sob meu ponto de vista, evidencia um desejo de participação e interesse político inédito em grande escala. Entretanto, penso que fazer da internet o “espaço” exclusivo da luta política das camadas médias é um tema que merece maior atenção. É a internet suficiente como meio difusor do processo de construção de cidadania? É possível apenas através da internet alcançar a totalidade da população e inclui-la no processo de construção da cidadania?  Nos demais países a intervenção da internet limita-se a difusão de idéias que visam a mobilização e o debate no mundo real, porque no Brasil este fenômeno não ocorre?

Penso que a reflexão sobre a ação “delimitada” das camadas médias no mundo político nacional, incluindo sua resistência a participar das manifestações populares, poderia estimular o debate sobre o tema e uma revisão de postura. As camadas médias crescem no país, e, portanto ganham força, qualidade que não deve ser desperdiçada, menos em um momento no qual o país passa por grave crise moral e política. Neste momento, este contingente da população é chamado a manifestar-se consistentemente na busca da revalorização dos princípios morais e éticos os quais sempre defendeu. É convocado a exigir compromisso e competência dos políticos na gestão pública e responsabilidade com os recursos públicos. A atuação ativa das camadas intermediárias no campo político é insubstituível e indispensável para o amadurecimento político de um país.

 






 











Um comentário:

  1. Mara , só hoje, acredite... Só hoje cheguei ao teu Blog. descupe a omissão. Um beijo e estou seguindo .

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